" nadando contra a correnteza... nada mais pra segurar... o vazio que te pesa de inconstâncias, pro fundo das tais águas escuras, recomeça a te sugar... sentindo-se afundar na mais obscura confusão mental, num mar de lembranças e dores, e a correnteza a te arrastar...
... e o momento sublime de solidão, que é ao levantar os braços, esticar os dedos, sacudi-los, balança-los, freneticamente em busca de algo para se segurar, mas não há nada para mante-la na superfície, nada pra se agarrar... no tato desesperado, só águas escuras e densas a te arrastar, o fundo do oceano que veio de perto só pra te buscar, mas que honra...
... inevitável é o pensamento: e agora? ... então nessa tempestade, tudo que resta é GRITAAAAAR! mas só se houve o eco ironicamente a te imitar: AAAAR... AAAR... AAR... ar... GRITAAAAAR! AAAAR... AAAR... AAR... ar... um cinismo do abismo vazio, já que... falta ar, falta ar!
... ao olhar para o alto, as nuvens negras estão sob sua cabeça, e a lua cheia está próxima, pois se achegou no tardar da noite e veio te saudar, com as milhares de estrelas ao longe, brilhando timidamente, sem te dar importância, só às vezes para espiar... ... e em meio a tais devaneios, ouve a lua a sussurrar: deixe a água te levar...
O toque macio em seus cabelos a te afagar, lágrimas que caem, de início furtivas, e depois a jorrar, são gotas vermelhas que caem n'água e ficam por ali ondulando, a te cercar... e seu grito, agora mudo, que já não pode mais ecoar, e todo o gelo da água a te cortar, dilacerando sua carne com o frio... afundando... afundando... afundando... o oceano a te abraçar, um acalento forte, um abraço apertado pra te esmagar, frio pra imobilizar, pesado de pesar por você, pra te ajudar...
Do côncavo de suas mãos, aquele mesmo vazio, nada pra segurar... as sacudidas de seu corpo já não são mais frenéticas... e você se solta, e sem resistência se deixa levar, afundar... ao olhar pra cima, uma última vez, uma visão embaçada da superfície, a lua a se afastar... um barco por ali a navegar! levanta as mãos pro alto, olhos arregalados, os pés se debatem, tenta subir, mas não há força... tarde demais... demorou a chegar... o ar está se esgotando... o último grito de agonia que não saiu, águas negras ao seu redor, entrando em sua garganta pra te inundar... afogar... afogar... afogarrr... ar... aaaaaah... "
Natália Vieira


0 comentários:
Postar um comentário