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Velharias - Parte 2

A ansiedade me
cansava, abri a porta com um pouco de receio, o brilho diminuiu... O guarda
roupa estava repleto de tesouros perdidos, eu, fui buscar o que me cabia
encontrar, e, quem sabe cada pessoa também iria lá à procura de seu tesouro... Haviam caixinhas de música das mais variadas formas, livros com capas de couro,
outros com capas de veludo, tiaras e coroas com belíssimas pedras incrustradas,anéis, brincos, cordões, pulseiras e outras joias caindo de um baú, estátuas
que representavam deuses e deusas, anjos, mulheres e homens extremamente belos
em sua nudez e gárgulas horríveis, animais empalhados, amostras de ervas em
vidros, não sei se venenos ou remédios, mas, tudo depende da dose... dos vidros
nem consigo falar, eram grandes, pequenos, de formas que nem nunca vi, cores estranhas,
com coisas que nunca encontrei no mundo mergulhadas em líquidos esquisitos...
rosas secas e despedaçadas, como que lembranças de uma juventude que há muito
já se passou, presentes de um amor que já não existe mais, roupas enigmáticas e
velhas, vestidos de rainhas, trapos de camponesas, armaduras de cavalheiros,
chapéus e laços de caubóis, túnicas encardidas de sacerdotes, sobretudos negros
e longos de homens misteriosos, lenços de donzelas e piratas entre outras
centenas de vestimentas, a quem teriam pertencido todas essas velharias?
Pergaminhos que deviam conter muitos mistérios, potes de tintas, pincéis cheios
de detalhes desenhados e
esculpidos em seu corpo, e eu pensei, são como joias
que produzem joias, ah... os quadros, muitos quadros, pinturas, quadros de
pedras, de conchas, de areia, de madeira... quadros que davam medo, outros que
traziam alegria, paisagens, naturezas mortas, flores vívidas, infernos e seus
demônios, anjos no céu, animais, damas em fuga, cavalheiros apaixonados, cestas
de flores e frutos, árvores secas e carregadas, castelos, casas simples de madeira,
de tudo que já existiu e que se pode imaginar haviam pinturas... eu passaria
dias se fosse descrever os detalhes de tudo que pude ver e ouvir... sim, ouvi
sons... pássaros de muitas espécies que nem conhecia,
animais que rosnavam,
outros que rugiam, eram tantas cores matizadas que enlouqueceriam qualquer
sentido, crianças chorando, pessoas rindo, gritos de seres em agonia, gemidos
de amantes em prazer, som de palmas por congratulação a algo bem feito, nomes
sendo sussurrados, outros sendo berrados, ouvi orquestras, ouvi o som de vários
instrumentos musicais e isso agradou meus ouvidos, pessoas cantando, cantavam
sozinhas, cantavam juntas, músicas depressivas e outras esperançosas, ouvi o
som do vento, das folhas dos
galhos das árvores balançando ao vento, senti o
cheiro das flores que o vento trazia, um odor melhor que outro, doces,
cítricos, florais, frutais, amadeirados, sedutores, enjoativos, mas, todos
atraentes a alguém de alguma forma... Senti cheiro de comidas, de uns gostei,
doutros não, mas, deu fome, ouvi o zunido de mil abelhas e o doce cheiro do mel
selvagem, me deu vontade de ir lá provar. O odor de bebidas alcoólicas era
fascinante, o hidro mel me deu água na boca, era daquele
caseiro, licores de
tantos sabores que quase me perdi, os vinhos eram antigos e diferentes de tudo
que conheço e tinha tanto mais quanto se pode imaginar de bebidas ... Senti o
cheiro de fazenda, curral, vaca, cavalo, couro velho, capim amassado, leite
tirado na hora... Cheiro de cidade, tudo misturado, fumaça que saia dos
escapamentos dos automóveis e, desse odor não gostei... Vi o deserto e senti o
cheiro de cactos e o silêncio da seca, a areia escorreu por meus pés...Ouvi o som das águas,
sim, das águas... ouvi as ondas baterem nas pedras no litoral e, senti o cheiro da maresia, e o som que a gente ouve colocando a concha de encontro ao ouvido... ouvi o som da correnteza dos rios, e o cheiro bom de água doce... ouvi o som belo da cachoeira, água caindo bruscamente batendo nas pedras, sem parar, som alto, e senti o cheiro das pedras, dos musgos e
da floresta que cercava a cachoeira e, o som das águas me deixou em grande estado de êxtase e hesitação, queria ir embora para o reino das águas, mas, maldição! Aquele não era meu tesouro e eu poderia por lá me perder para sempre... aquele guarda roupa era mágico, por dentro tinha um espaço infinito, era um portal para sabe-se lá onde, oh! Sabe-se lá sim, era a porta para os sonhos de quem gosta de
sonhar e quer realizar, e a porta da agonia, para quem gosta de sofrer, e deseja uma vida de sofrimento, afinal, para quem gosta da dor, nada melhor que a dor eterna... Por alto, parece até ser algo bom, mas, não era, e representava uma maldita armadilha para pessoas indecisas... Quem lá fosse sem ter certeza do que buscar, poderia se perder naquele mundo de sonhos alheios por cair na simples magia e admiração
momentânea por algo que não era seu, e ficar preso num quadro de outro, e se tornar uma escultura, ou o espinho de uma rosa, ou ser a pedra onde a água bate... quase fiquei, mas, consegui novamente me lembrar a que estava lá...

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